— Chega um pouco pro lado... agora ajeita as costas.
— Acha melhor mesmo gravar isso?
— Se colocar só o texto ninguém lê; perfil de app de encontro é imagem, meia dúzia de linhas e olhe lá; e foto. Foto, foto, foto. Desabotoa esse último botão que tá parecendo um enforcado.
— Esse...? Tá. Mas eu não tô confortável de gravar assim lendo... preferia só pendurar o texto no lugar que dissesse "descrição", no perfil, e pronto...
— Não tem espaço lá pra isso. (e nem ninguém quer saber ou vai ler, caralho) Mas um link de vídeo de repente funciona; sempre tem uma maluca que curte excentricidade. Ou maluco, não sei qual é a tua.
— Maluca; quer dizer, mulher, só, mesmo.
— Beleza; tanto faz. Luz tá boa, fundo branco basicão... melhor aproveitar pra fazer logo, que tá entrando pouco barulho da rua.
— Tá...
— E menos cara de enterro, que ninguém se vende assim. Já falei que o texto tá uma merda; mas você que sabe.
— Então pode gravar [ ]
[ ] Sou professor novato
(talvez por isso prefira sexto ano?), amigo
de livros, filmes, séries, e de cães e de algumas poucas pessoas humanas.
Já trabalhei por década e meia com música (porque nunca pude viver sem ela) e tenho dois filhos e uma filha, todos
grandes e fonte de muito orgulho e com os quais aprendo todo dia. Leio muito
pouca poesia e quase não vou a teatro – duas coisas que me propus a mudar,
porque mudar com coragem é sempre bom.
Péssimo dançarino, não deixaria, porém,
meu par sem par... Também acampo, faço trilhas, sou mais Beatles (mato) que
Rolling Stoles (praia), e gosto muito da espontaneidade que exercito para
equilibrar minha necessidade de propósitos e mapinhas-de-cotidiano (quem não
tem ilusões de controle sobre a própria vida?).
Já me disseram que se eu fosse bicho, seria um cachorro que lê. Não me peça para explicar,
mas estou sempre com 6, 7, 8 livros em leitura; não é presepada nem nada, não.
É só uma mistura de inquietude de interesses (intelectuais) e uma vontade de abraçar muitos começos.
Escrevo (ensaios,
artigos, vezenquando ficção), ainda insisto em lançar CDs pelo meu selo de rock
progressivo, e, para minha surpresa, tenho sido muito feliz na Educação. Sou virginiano – do tipo organizado,
apenas dos 40 anos pra frente – antes, era o caos em pessoa; hoje, sou o cara
da obrigatória agenda de papel (já soube que isso não é sexy; paciência...).
Gosto de cozinhar
e de garimpar artesanatos por onde
serpenteio e de viajar com pouca
ou nenhuma companhia. Tenho procurado me
tornar não uma pessoa importante, mas necessária
(e essa aprendi com Nego Bispo, e com quem a ele me apresentou); e preservar
espaços para os anacolutos da vida,
que eles são mais comuns do que na linguagem.
Não dou conta de
muita vida digital; é um pouco geracional, penso, mas nunca achei que havia
tempo suficiente para gerir presença em tantos universos (Facebook, Twitter, Instagram, etc.) além do comezinho mundo físico
dos empregos, filhos, contas, amores e casamentos. Tento, contudo, ceder,
porque não sou assim tão ranzinza nesse quesito de me atualizar.
Ah! não tenho time de
futebol (meus alunos acham isso o cúmulo), mas adoro acompanhar Copa do
Mundo. Fui casado três vezes (as duas últimas com a mesma moça e mulher); sou um otimista e ainda acredito no
amor. E por isso preciso desamar (“And do I really have a hand in my forgetting?”).
Aqui, portanto, meu projeto e apresentação; e minha disposição cheia de riscos e perigosa
– nem tanto para amizades novas,
companhias divertidas e para volteios
casuais-esclarecidos-consensuais, mas para quem se pegue (de surpresa) pelo meu temperamento setembrino se infatuando.
(porque não sei – ainda – se [já] consigo desamar) [ ]
[ ] — Foi... Quer que aplique um filtro, alguma coisa? Sua cara seca não tá ajudando, não.
— Não; filtro nenhum, não. Ficou mais ou menos, pelo menos?
— Ficou a merda que só podia ficar, né. Vou mandar o vídeo por e-mail e WhatsApp. Agora, deixeu correr aqui pra guardar as coisas que tenho filmagem em Campo Grande e tá vindo chuva por aí, pra terminar de foder o meu dia [ ]